Pequeno manual do ofício de descrever pequenas vastidões sem o uso de palavras
Pode ser.
Pequeno manual do ofício de representar pequenas vastidões.
(e algumas utopias sobre paisagens)
- Ter uma imensa saudade sem objeto lá muito definível.
- Dirigir-se às possibilidades de descrição dos fenômenos espaciais, virando-lhes as costas.
- Ficar confuso numa mesa de bar com Francis Ponge.
- Especificar o vago comum.
- Ser ingênuo o suficiente a forçar a impossibilidade de muitas de nossas correspondências espaciais: olhar que pode atravessar o que é mais opaco, olhar que pode ir ainda mais longe assim que somos obrigados a estarmos muito perto.
- Apontar e não dizer, poetizar para abolir a possibilidade da contradição.
- O distanciamento do tema e do objeto é o exercício e seu pretexto.
- Colecionar cartões postais artesanais, catálogos difusos (esparramados) cheios de regiões e atmosferas, com preguiça de seus sons e odores.
- Transformar todas as distâncias em lugares.
- Enclausurar todos os fenômenos em dois modelos: o verde para as formas irregulares e o azul para todas as outras.
- Dar luz a estruturas ortogonais e organizações esquemáticas enquanto as nega em nome da intuição universal.
- Elucidações inexatas.
- Apregoar o não-pitoresco ao pitoresco e vice e versa.
- Mostrar que o lugar tinha exatamente essa aparência demonstrando que tinha mais ou menos essa aparência.
- Desencanar dos binóculos e dos telescópios.
- Estar consciente que tudo é representação, e que toda representação é uma exteriorização do que queremos ter acesso.
- E mesmo assim insistir em homenagear imagens que não comportam sua própria acessibilidade, representar até onde não chegaríamos.
- Infidelidade à memória.
- Buscar ver melhor se colocando em frente ao seu próprio campo de visão.
- Repetir exaustivamente a mesma equação errada afim que de repente ela pareça exata.
- Nunca saber, em todas essas situações e regiões, se é possível fazer isto ou aquilo.
- Amor involuntário a todas práticas anteriores.
Publicado no catalogo da exposição Vistas a Perder de Vista, curadoria de Claudio Cretti.
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